Redescobrindo a Batata

Redescobrindo a Batata

A batata e o açúcar foram dois alimentos que revolucionaram a cultura ocidental. A base alimentar dos europeus era o trigo, mas em verão chuvoso o grão produzido não era suficiente para alimentar toda a população, isto significava fome. Além da busca por metais e pedras preciosas, os exploradores da época buscavam também condimentos (especiarias)

A batata e o açúcar foram dois alimentos que revolucionaram a cultura ocidental. A base alimentar dos europeus era o trigo, mas em verão chuvoso o grão produzido não era suficiente para alimentar toda a população, isto significava fome. Além da busca por metais e pedras preciosas, os exploradores da época buscavam também condimentos (especiarias) e outros vegetais que pudessem servir de alimento. Dentre tantas espécies botânicas trazidas para a Europa, nenhuma delas se compara a batata.

No início da sua introdução houve grande resistência por parte da população, primeiro por não ser citada na bíblia – a igreja católica era a religião de quase a totalidade do europeu naquela época. Também havia alguma semelhança com uma planta, da mesma família da batata (Solanaceae), que era tóxica para as pessoas e animais, a beladona. Por outro lado, era possível ver, nos locais onde a batata foi incluída na alimentação, a saúde das pessoas, principalmente nas crianças. Então os governantes que conseguiam ver os benefícios da batata na alimentação começaram a obrigar as pessoas a plantar batatas.

Várias estratégias foram usadas para difundir tanto o plantio como o consumo do tubérculo. Por volta de 1814, o então rei da França, Luiz XII, juntamente com o farmacêutico Antonie Augustin Parmatier, organizaram uma simulação prática para disseminar a popularidade da batata. Parmatier afirmava que teria sobrevivido como prisioneiro capturado pelos prussianos, durante a Guerra dos Sete Anos, por ter se alimentado somente de batatas. A estratégia seria cultivar batatas em praças públicas e com a vigilância do exército durante o dia. À noite, a guarda deixava o local e as pessoas imaginavam que se houvesse algo para ser guardado, valeria a pena ser roubado. Certamente esta e outras estratégias contribuíram para popularizar a batata como alimento em toda Europa.

A adoção da batata como principal alimento ficou mais evidente quando uma doença (requeima, Phytophtora infestans) destruiu as lavouras do tubérculo na Irlanda entre 1845 até 1848, levando a uma catástrofe, quando mais de um milhão de pessoas morreram, e forçando a migração de grande parte da população na época. A base da alimentação daquele país consistia basicamente de batatas.

A batata nos dias atuais ainda é o principal alimento dos europeus e norte-americanos. A batata é cultivada em praticamente todos os continentes, desde que tenha uma “janela” climática com temperaturas amenas e não sujeita às geadas pode se cultivar a batata.

Apesar de não fazer parte da dieta tradicional dos asiáticos, a batata foi descoberta por eles assim como aconteceu na Europa. Hoje o maior produtor de batata do mundo é a China (mais de 5 milhões de hectares), que tem esta cultura como segurança alimentar. No continente africano também há uma forte tendência de aumento de área em vários países, como Quênia, Tanzânia, Angola, Moçambique etc.

 

“Se juntarmos a história fascinante da batata, suas propriedades nutricionais e sua versatilidade na cozinha, surge a questão: por que não comer mais batatas?”

 

Qual seria a razão pelo redescobrimento da batata como alimento que promove segurança alimentar? Primeiro é que foi a protagonista do crescimento de um continente, isto é fato. Mas o que levou a isto?

Há quem diga que batata é alimento energético, rico em carboidratos, mas durante a fome da batata na Irlanda, a principal causa das mortes era por escorbuto, que é a falta de vitamina C, nenhum nutricionista ousaria receitar batata como fonte desta vitamina. Além das vitaminas C, vitamina B6, Tiamina, Niacina, possui ainda sais minerais como Potássio, Fósforo, Magnésio e Ferro, com conteúdo de proteínas entre 1,8 a 2,0% de proteínas, elevando seu valor biológico abaixo somente do ovo. Para complementar suas qualidades nutricionais ela possui antioxidantes que atua como prevenção de uma série de doenças e retarda o envelhecimento.

Com tantas propriedades, a batata ainda goza de prestígio na culinária. Ela é versátil. Pode ser preparada de várias formas – não esquecendo que a maneira de preparo pode comprometer sua reputação de alimento saudável, acrescentado ingredientes calóricos como gorduras na fritura, queijos entre outros. Por outro lado, cozida e assada em forma de purê é saudável e nutritiva como poucos alimentos.

Se juntarmos a história fascinante da batata, suas propriedades nutricionais e sua versatilidade na cozinha, surge a questão: por que não comer mais batatas?

Durante a pandemia, a batata fresca teve um aumento expressivo no consumo. As pessoas deixaram de frequentar restaurantes e passaram a cozinhar mais em casa. Para atender melhor estes clientes, seria oportuno que nosso mercado disponibilizassem uma quantidade maior de variedades de batata. Nosso mercado se restringe a poucas variedades e, pior que isso, não oferece informações para cada variedade e de que tipo de prato determinada variedade é mais indicada. É comum encontrar nas gôndolas do supermercado dizeres, como “batata especial”, “batata lavada”, entre outros que na verdade não oferece informações necessárias para quem vai utilizar estes tubérculos na cozinha.

Para cada finalidade existe variedades indicadas. Para fritura, uma variedade deve ter matéria seca alta, pouco açúcares redutores (que causa coloração marrom depois de frita). Por outro lado, para cozinhar, a variedade deve ter matéria seca média, pois se for muito alta pode se desfazer no processo de cozimento. Ainda, se a matéria seca for muito baixa, não terá textura agradável.

A batata é um alimento muito rico em diversidade, pode ter sabor de gosto neutro ou acentuado, tem variação na cor da pele e da polpa, na concentração de nutrientes e aptidão para determinado prato. Como admirador incondicional do tubérculo, gostaria que nosso país um dia se tornasse, a exemplo dos países andinos ou europeus, em um verdadeiro comedor de batatas e nosso município recebesse o título mais uma vez de “A Terra da Batata”.

 

Pedro Hayashi

Engenheiro agrônomo e pesquisador

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